A lavagem nasal é um procedimento descrito há mais de 5 mil anos na medicina tradicional indiana, a Ayurveda, em que teria efeitos positivos tanto na função respiratória, levando a um maior bem estar físico e mental. Ainda hoje, na medicina ocidental, é amplamente incentivada para auxílio no tratamento de diversas doenças das vias respiratórias, mas que pode gerar várias dúvidas na hora de colocá-la em prática!
Para entender sua importância é interessante que saibamos um pouco mais sobre o funcionamento do nariz e dos seios da face (ou seios paranasais).
O nariz e seios paranasais são extensas superfícies recobertas de mucosa, determinada por saliências e reentrâncias no crânio e ossos da face que são responsáveis pelo equilíbrio da temperatura e umidade do ar inspirado, tem função olfatória e de “filtro” para o ar inspirado (por ação de agentes imunológicos e enzimas presentes no muco nasal), além de atuar na ressonância da voz. Tais processos são dinâmicos e variam de acordo com mecanismos internos e em resposta à estímulos externos. Nesse tecido respiratório, temos cílios microscópicos, que se movimentam de forma harmoniosa para remover continuamente o muco para fora dos seios. Isto é chamado de Cleareance mucociliar e se repete de 2 a 3 vezes por hora!
Para que essa atividade aconteça adequadamente, é necessário que as condições sejam boas para o funcionamento dos cílios, como temperatura adequada (normalmente entre 18 e 33°C), pH próximo a 7, por exemplo. Toxinas específicas, como as produzidas por bactérias (que também podem lesar o cílio diretamente) ou inaladas, assim como uma variedade de viroses, causam redução do batimento ciliar. O movimento dos cílios comprometidos e/ou acúmulo de secreções mais espessas que o normal, pode predispor a instalação de processos infecciosos.
O soro fisiológico, em diversas formas de apresentação e aplicação, é utilizado para o tratamento clínico das rinossinusites (incluindo as rinites), pois seus benefícios incluem a limpeza do muco nasal, diminuição da inflamação local (pois reduz mediadores inflamatório como prostaglandinas, leucotrienos e histamina), das secreções purulentas, restos de células e crostas, além de melhorar o funcionamento do sistema mucociliar como um todo. É o tratamento mais conservador e mais simples de todos! Em pesquisas realizadas in vitro, observou-se que a solução salina isotônica levou a menor viscosidade do muco nasal e melhora dos movimentos dos cílios, porém seu mecanismo ainda não foi completamente elucidado.
Em 2005, a Academy Of Allergology and Clinical Imunology e a European Rhinological Society não recomendavam o uso da lavagem nasal com soluções salinas por não haver estudos suficientes na área, sendo a prática considerada “potencialmente benéfica” (nível de evidência IIb). No entanto, em uma revisão sistemática realizada pelo renomado grupo Cochrane em 2010, utilizando estudos controlados e randomizados, demonstrou que pacientes que realizaram a lavagem nasal tiveram uma menor tendência a usar antibióticos, tampouco observados eventos adversos importantes (alguns pacientes apresentaram pequeno desconforto ou sangramento nasal, que se relacionou mais à pressão aplicada que na solução salina em si).
Em 2012, a EPOS- European Position Paper On Rhinosinusitis And Nasal Polyps, principal guideline utilizado para prática clínica no assunto, mostrou nível de recomendação A no tratamento das rinossinusites (maior nível de recomendação).
Para a lavagem nasal em bebês e crianças pequenas podemos nos deparar com várias dúvidas e inseguranças. Para isso, podemos usar algumas dicas:
– Sinta-se confortável para fazê-lo: você pode começar com pequenos volumes de soro fisiológico e com pouca pressão! Depois que tiver mais confiança e que a criança estiver mais habituada, aumente! Se quiser, também pode-se usar uma pera para aspiração nasal após colocar o soro.
– Prefira deixar a posição sentada ou em pé: as crianças possuem a tuba auditiva (canal que liga o nariz até a orelha média) mais curta e horizontal, que facilita com que haja refluxo de líquidos para esta região, principalmente se a criança estiver deitada.
– Escolha a forma de aplicação mais adequada para você: nos estudos, não houve diferença entre a aplicação com sprays ou duchas!
– Segurar a respiração ou falar “Ah!” por alguns segundos: em crianças maiores e com maior compreensão, pode-se ensinar a prender a respiração ou falar “Ah!” durante alguns segundos. Isto diminui o desconforto do líquido ir para a garganta. Depois é só cuspir e/ou assoar o nariz.”

Quantos mL posso colocar em cada narina?
Não existe uma quantidade fixa para isso, nem por idade. Isso varia muito se a criança está mais secretiva, se tem algum processo infeccioso associado, ou se é somente para limpeza nasal. Comece com pequenas quantidades, como 0,5 a 1 ml em cada narina para os bebês, e depois repita quantas vezes forem necessárias. Conforme você adquire segurança ao fazê-lo, pode aumentar a quantidade se houver necessidade. No vídeo, vemos que a mãe coloca uma quantidade de 5ml.
Qual a temperatura que o soro precisa estar?
O ideal é o soro estar em temperatura ambiente ou morno, nunca gelado. Dessa forma, mesmo a secreção mais espessa consegue ser eliminada.
Qual a posição do bebê quando fizer a lavagem?
O bebê ou criança deve estar sentado ou em pé, com a cabeça levemente reclinada para frente.
A boca do bebê precisa ficar aberta ou fechada?
O ideal é que a boca do bebê esteja levemente aberta. Para adulto, que conseguem deglutir o soro, é indiferente.
A secreção precisa sair pela outra narina?
Não, não precisa! A secreção pode sair ou não, a depender da quantidade de soro colocada, a quantidade de secreção, e o jato. O mais comum é sair um pouco de soro pela própria narina, o soro sair pela boca ou a criança engolir o soro com a secreção, e aí saí pelas fezes né…
O bebê pode engasgar? Pode dar otite? Perfurar o ouvido? O catarro ir pro pulmão?
Quando feita de forma segura, com o bebê sentado, com a cabeça reclinada para frente, o soro com a secreção sairá pela própria narina ou será deglutido. O nariz, ouvido e garganta estão interligados, portanto a secreção acumulada já está lá, se há um processo infeccioso. O soro irá mobilizar essa secreção. A lavagem com soro não “causa” otite, muito menos pneumonia, nem é capaz de perfurar o ouvido! O processo infeccioso instalado, sim.
Preciso fazer todo dia?
O nariz está em constante contato com o meio externo. A higiene nasal é interessante ser feita, mas não necessariamente todo dia, nem precisa ser a seringa. Você pode usar sprays, jato contínuo, conta gotas. Se há mais secreção, provavelmente precisará aumentar a frequência e o volume do
Consideração importante!
Obviamente o procedimento deve ser feito da forma correta. Se você tem medo de fazer, pergunte ao seu médico como deve fazer, peça para demonstrar!

Fonte: Pediatria descomplicada – Dra. Kelly Marques Oliveira